AMOR DE TARDE
(Mario Benedetti)
É uma pena você não estar
comigo
quando olho o relógio e já são quatro
e termino a planilha e
penso dez minutos
e estico as pernas como todas as tardes
e faço
assim com os ombros para relaxar as costas
e estalo os dedos e
arranco mentiras.
É uma pena você não estar comigo
quando olho
o relógio e já são cinco
e eu sou uma manivela que calcula juros
ou
duas mãos que pulam sobre quarenta teclas
ou um ouvido que escuta
como ladra o telefone
ou um tipo que faz números e lhes arranca
verdades.
É uma pena você não estar comigo
quando olho o
relógio e já são seis.
Você podia chegar de repente
e dizer "e
aí?" e ficaríamos
eu com a mancha vermelha dos seus lábios
você
com o risco azul do meu carbono.
Antologia Poética, Record em 1988, tradução é de Julio Luís Gehlen. Originalmente do livro escrito entre 1953 e 1956, Poemas de la oficina, de
Benedetti.
Nenhum comentário:
Postar um comentário